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  • Gabriele da Luz Mello e Laisa Dias

Problemas na acessibilidade de serviços de saúde afetam pessoas com deficiência

Atualizado: 19 de mai. de 2022

Pacientes reclamam da falta de acessibilidade em Unidades Básicas de Saúde (UBS) periféricas de Itapecerica da Serra e Capão Redondo. "Bem complicado", diz Lucicleide, mãe de um adolescente com Transtorno do Espectro Autista.


Por Gabriele da Luz Mello e Laisa Dias


Imagem: Fotógrafo/Flickr Whittlz


Pacientes de Itapecerica da Serra e Capão Redondo relatam falhas no atendimento das unidades de saúde, que muitas vezes os levam a percorrer longas distâncias em transporte público precário para receber atendimento. O acesso aos postos e hospitais são, muitas vezes, uma grande preocupação para quem depende da saúde pública. As reclamações vão desde a distância das unidades capazes de realizar os atendimentos especializados até a carência de estruturas suficientes no atendimento de estabelecimentos.

Lucicleide, mãe de Daniel, de 15 anos, que foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), relata problemas para levar o filho às consultas. "Eu acho o meio de transporte bem complicado", diz a moradora do bairro Valo Velho, em Itapecerica da Serra, ao citar que depende de um ônibus que passa em intervalos de 1 hora e ainda sofre alguns atrasos. Além dos problemas no transporte público, a mãe do paciente relata a indiferença durante o atendimento: "nem o papel ela quis pegar", narra a mãe, que queria entregar um documento feito pela escola, informando sobre o comportamento que o filho apresentava e as dificuldades enfrentadas por ela: “ela simplesmente quase nem olhou na minha cara".

O descaso com as pessoas com deficiência leva a uma confusão no tratamento dos pacientes, que se enxergam perdidos, sem saber qual medicação é a mais adequada, onde devem procurar atendimento e qual especialista podem ajudar no tratamento. Neste contexto, Lucicleide declara que gostaria que exames mais específicos fossem feitos no filho, já que ele toma vários remédios, e ela não sabe como isso tem afetado a saúde geral de Daniel: “eu estou sem saber em qual médico eu peço, queria um exame mais detalhado. Não sei com qual médico seria apropriado pedir esses exames.”

Lívia, três anos, foi diagnosticada com agenesia de membros, condição em que há ausência total ou parcial de membros, como mão, braços ou pernas. Ela e a mãe, Jhenifer, moram no Capão Redondo, Zona Sul da cidade de São Paulo. A região do Capão Redondo, inclusive, possui apenas três serviços de saúde considerados acessíveis, de acordo com o Mapa da Rede de Serviços Acessíveis disponibilizado pela prefeitura de São Paulo.


Imagem: Reprodução/Mapa de serviços - Prefeitura de São Paulo


Jhenifer aponta que os médicos muitas vezes não fornecem os encaminhamentos necessários e a pediatria não solicita exames frequentes para as crianças: "o posto não dá muitas respostas para a gente", diz a mãe sobre o atendimento. Assim como Lucicleide, ela já enfrentou o descaso de médicos, Jhenifer relata: “mas ela tem o quê? A gente já tinha explicado que ela tinha agenesia de membros”. Já Lucicleide relata o descaso nos momentos de marcar consultas, com desrespeito à lei de atendimento prioritário (Lei nº 10.048/00): "tanto ele (Daniel) como a maioria das pessoas, idosos, pessoas com criança, gestantes teriam que ter um cuidado a mais, um atendimento prioritário. Mas não, é de idosos a criança especial, enfrenta a fila que for. Quando eu vou passar o Daniel, tem a ‘plaquinha lá’ que é preferencial, mas nem elas (as recepcionistas da unidade) não querem atender, querem que a gente fique na fila normalmente.” Da mesma forma, a consulta com o psiquiatra que foi marcada em março só acontecerá em junho.


Os problemas aparecem também na estrutura das UBS. Thiago, aos 42 anos, tem paralisia cerebral, condição que causa alterações neurológicas que afetam o desenvolvimento motor e cognitivo que, no caso de Thiago, foi causada por falta de oxigenação. Ele diz ter dificuldades para acessar o posto de saúde próximo a sua casa, em Itapecerica da Serra, porque não consegue ir até a unidade com sua cadeira de rodas se não for de carro. As dificuldades de deslocamento, como as encontradas por Thiago, dificultam o acesso aos serviços de saúde mesmo quando a unidade encontra um desempenho satisfatório nesse quesito. Assim, barreiras arquitetônicas e ambientais limitam, principalmente numa cidade como Itapecerica da Serra, que tem relevo acidentado.


O descaso da prefeitura com as UBS

Uma terapeuta ocupacional da cidade de São Paulo, que pediu anonimato, aponta a importância do Conselho Gestor para as melhorias na estrutura das unidades de saúde. "O conselho gestor é da comunidade, o povo vota junto com os funcionários para pedir uma melhoria", diz a terapeuta quando questionada sobre a falta de acessibilidade em UBS mais periféricas. Este problema indica o possível descaso dos órgãos competentes com as Unidades de Saúde Básica. "A gente recebe ordens lá de cima, às vezes não tem material, não tem remédio. A gente não recebeu para passar para o usuário". Ela salienta a violência que sofre dos próprios pacientes ao se deparar com a falta de investimentos e reposições que deveriam ser feitas pela Secretaria de Saúde, mesmo que aponte não achar ter muitos problemas de acessibilidade nas unidades em que trabalha.


De acordo com o IBGE, no Censo de 2010, o estado de São Paulo conta com mais de 3 milhões de pessoas com deficiência. Nas propostas do Conselho Regional da Pessoa com Deficiência na gestão 2019-2021 já constavam reclamações recebidas bastante semelhantes às relatadas por Jhenifer, bem como de Lucicleide e Thiago, o que indica a existência de problemas parecidos nas duas cidades, como falta de acesso estrutural e desconhecimento e despreparo dos profissionais.


Mesmo com os desafios diários, as famílias dos pacientes não perdem as esperanças e forças para continuar os tratamentos. "Eu fico muito impressionada, eu tenho muito orgulho", é o que diz Jhenifer, sobre o desenvolvimento diário da filha Lívia. E Lucicleide, por sua vez, reforça que infelizmente existe um abandono, mas ela se sente feliz por tudo que conquistou ao lado do filho, agradecendo principalmente à escola. No entanto, ainda diz: "eu gostaria que ele (Daniel) tivesse muito mais coisas”, referindo-se a atividades complementares, como terapias e esportes.


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