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Thomas Toscano

Clássico do futebol de várzea

Atualizado: 30 de nov. de 2020

PAPA LITRINHO FC X ASCOLI FC



Por Thomas Toscano



Capa do vídeo do canal Thiago Fut10 [Reprodução: Youtube]


Faz tempo que não tem jogo. Já fazem quase onze meses que não jogo bola e me sinto cada vez menos brasileiro. Os grandes clubes já voltaram a jogar, mas o futebol mais interessante do Brasil ainda está interditado: a várzea!


Pois qual é a rivalidade de um Corinthians e Palmeiras perto de PAPA LITRINHO e ASCOLI? Dois gigantes da várzea de Camaragibe, no Pernambuco, se enfrentaram pela última vez em julho do ano passado.


Para o leitor paulista, que agora se pergunta “por quê estou lendo uma crônica do futebol amador de Pernambuco?”, eu respondo que, simplesmente, a vida toma caminhos inexplicáveis. Muitos outros torneios poderiam figurar no jornal, mas só um deles é descrito com tamanha riqueza de detalhes. Cortesia provida por “Thiago Fut10” em seu canal no youtube. Com coberturas sobre os atletas e narrações emocionantes, nenhuma outra partida em todo solo nacional mereceu tanto o relato quanto essa.


Outro fator importante para a escolha é de que o tempo do vídeo, disponível no youtube, era o menor que encontrei. Ganhou, de curta margem, do campeonato +50, onde as pernas não aguentam tempos acima de 10 minutos. Mas sem mais delongas, vamos ao jogo.


Antes do início, o capitão do Ascolta deu o discurso motivacional: “a gente não pode começar tomando de um a zero de novo”. Depois disso, Célio Roberto pediu a palavra e exigiu calma, dizendo que “muitos tinham respeito por jogadores do outro time”. Porém, completou com a frase mais emblemática do clássico: “assim que o juiz apitar, acabou o respeito”.


Já o Papa Litrinho, último campeão, levava o jogo mais na boa. O goleiro já deu a letra: “A gente tá acostumado a levantar taça. qual é a diferença de ganhar mais uma?” Com excesso de confiança, o treinador Bira da Kombi reforçou que o necessário era chutar a qualquer custo no gol, sem essa de “toquinho pro lado”.


Feitas as preleções, o juiz apitou e acabou o respeito. Breno, eleito o melhor goleiro de Camaragibe, orientou os zagueiros e passou confiança, certo de que não tomariam um gol no começo do jogo novamente. Em vez de gol, tomaram um amarelo logo de cara e foram reclamar com o coitado do juiz que tentava controlar os ânimos.


Quartas de final do Campeonato Barreirense, campo enlameado pela chuva. Jogo muito truncado, com as duas equipes tendo mais vontade do que juízo. O Papa Litrinho, com todos seus títulos, subestimou o poderoso Ascoli e concedeu falta na entrada da área.


É claro que o Ascolti não tem um craque no nível de R3: Renato, o mago de aço. Suas cobranças de faltas a là Ronaldinho até parecem que são dos pés de um meia, camisa dez. Mas o ídolo do Papa Litrinho é zagueirão. Falta cobrada, bola pra fora.


A chuva aperta e o clima esquenta ainda mais. Capitão na bola e mais uma isolada. Sorte da equipe que os patrocinadores, como a Hiper Casa-do-Bolo e a Farma Belle disponibilizaram mais bolas, em caso de cobranças muito mal cobradas.


Quarta falta perigosa no jogo e dessa vez a bola vai no travessão. Os torcedores do Ascoli que não ligam pra chuva se levantam e começam a cantar apoiando o time. O apoio funciona e o time parte pro ataque, mas é parado pelo experiente goleiro Jhonny, numa defesa digna de Buffon.


A única diferença que se pode observar entre Jhonny do Papa Litrinho e Buffon é que o craque de Camaragibe tem menos cabelo, ao ponto de ser careca. O Ascoli não para de atacar e, num contra-ataque, o Papa Litrinho finalmente alça a bola ao camisa nove, que cabeceia no travessão e põe as mãos na cabeça. Johnny começa a se incomodar e pede calma aos companheiros.


Na quinta falta pro Ascoli, o batedor resolveu caprichar e isolar mais uma. Thiago Lemos, o narrador, comenta simplesmente com: “Meu Deus…” e faço das suas palavras as minhas. E quem não faz toma! R3, o mago de aço, o ídolo, a lenda precisou só de uma falta a favor de seu time para converter um belo gol no ângulo. Papa Litrinho 1 a 0. Golaço!


Após o fim do primeiro tempo, o camisa 11 Pedro disse que o principal para o Litrinho era segurar a pressão que viria na etapa seguinte e não deixar o outro time empatar. Mas a pressão não vinha só de dentro, já que a torcida recebeu os galácticos com vaias (mas sem xingamentos). Entrevistados por Thiago, os torcedores tentaram demonstrar o apoio ao Ascoli e apostaram nos dois gols de Celinho para virar o jogo. Mas, o entrevistador não quis saber de papo e perguntou: “Mais quantos do Papa Litrinho?”


E é impossível permanecer imparcial no futebol de várzea. Eu, que prezo sempre pela neutralidade, não posso deixar de esconder minha simpatia pelo Papa Litrinho e seus galácticos, mas também não deixo de apoiar os subestimados guerreiros do Ascoli.


Segundo tempo

Célio Roberto, que disse que respeito ao adversário acaba quando inicia o jogo, entrou pilhado na segunda etapa e logo alçou um cruzamento e botou o centro-avante para correr. Foi derrubado entrando na área e pediu pênalti! O juiz apitou e a torcida foi à loucura!


Mas, movidos pela emoção, ninguém viu o bandeirinha indicando que a falta foi fora da área. Só depois de Célio Roberto já ter posicionado a bola em cima da marca do pênalti que o juiz mandou voltar. Nesse momento, torcida e jogadores se misturam num só corpo pra cobrar o coitado do bandeirinha. Um jogador até tirou a camisa de tanta raiva e a usou para dar “camisetadas” no rosto do bandeira. Célio afastou a confusão e pediu calma. Afinal, ainda era falta.


E de sua sabedoria surgiu o gol de empate. Na entrada da área mandou uma bomba indefensável até mesmo para o melhor goleiro de Camaragibe. Logo depois o juiz apitou e as duas torcidas foram pra cima dele. A do Papa Litrinho dizia que FOI pênalti, pedindo para que anulasse a falta que originou no gol e a torcida do Ascoli também dizia que foi pênalti e que, pelo erro do juiz, deveriam ser considerados vencedores. Nenhum argumento colou e o jogo foi para as penalidades. Infelizmente as filmagens se perderam, mas os galácticos comandados por Biro da Kombi venceram mais uma e seguiram adiante em busca de “mais um campeonato”, quase uma naturalidade.


O jogo é de 2019. O campo é de terra batida e com a chuva tende a ficar todo enlameado, já que os governantes nunca colocaram grama ali. Mas, o que resiste são os golaços, as polêmicas (sem VAR) e a esperança de ano que vem poder ver esses clássicos de novo. Até lá, espero ter ajudado a matar a saudade. https://www.youtube.com/watch?v=sl73YrCe5hw


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