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  • Thais Aya Morimoto

Educação especial: a exclusão dos alunos em sala de aula

Por Thais Aya Morimoto


Escolas públicas não conseguem garantir a inclusão de alunos com transtornos do desenvolvimento ou com deficiências intelectuais.


Roda de conversa sobre inclusão. [Foto: Thais Aya Morimoto]

Com a volta às aulas após a pandemia, escolas públicas de Minas Gerais e de São Paulo não garantem os direitos básicos de alunos com deficiências intelectuais ou com transtornos do desenvolvimento, como o autismo. Mesmo com o aumento da inserção desses alunos nas escolas, parte deles ainda são excluídos da socialização e da aprendizagem. Diversos relatos e depoimentos denunciam essa exclusão oculta que ocorre nas escolas, seja por falta de preparo dos profissionais, seja por falta de materiais adaptados.


Segundo o Censo Escolar de 2011 e de 2021, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o número de matrículas de alunos com deficiências intelectuais ou com transtornos do desenvolvimento subiu de aproximadamente 543 mil para quase 1,2 milhão, um aumento de 214,7%. A quantidade parece significativa, mas a maioria desses alunos frequenta a classe comum nas escolas, onde o tratamento nem sempre é como o esperado.


O que é a efetiva inclusão


Vivian Lederman, integrante do Comitê técnico da Organização Não Governamental (ONG) Centro Israelita de Apoio Multidisciplinar (CIAM), explicou ao portal Central Periférica que a inclusão não se limita à presença em sala de aula.


“O que a gente chama de inclusão é muito mais do que a matrícula. É essa criança de fato fazer parte de um grupo escolar, de um grupo com intenção pedagógica, ou seja, ela não está lá só para desenhar uma coisinha ou ficar num canto da sala. Ela está lá para aprender, ela está lá para se socializar.”


Conquistar a efetiva inclusão dos filhos nas escolas é um dos principais desafios que pais e responsáveis enfrentam atualmente. Para Damaris Braga, coordenadora do CIAM, essa forma de inclusão de crianças com deficiências ou com transtornos “está bem abaixo do que deveria”. Parte dos alunos, principalmente aqueles que estão em situação de vulnerabilidade social, ainda não recebe o tratamento adequado e não possui os seus direitos assegurados.


Vulnerabilidade social afeta a inclusão escolar


A vulnerabilidade social é uma situação que prejudica o acesso aos direitos básicos garantidos constitucionalmente. A existência de várias leis e a burocracia para que sejam cumpridas confundem e desanimam pais de crianças com deficiência. O Grupo de Mães de pessoas com deficiência Carapicuíba já percebeu isso e se une com justamente um dos propósitos de apoio mútuo entre pais na área jurídica.


A baixa renda também traz prejuízos a amplas áreas da vida do aluno. Lilian Rossi, professora na rede pública em uma área de periferia na zona norte de São Paulo, menciona as diversas áreas que podem ser prejudicadas.


"A vulnerabilidade social afeta a educação de todas as crianças, desde a alimentação, moradia, condições de higiene básica e acesso à saúde. Pensando especificamente nas crianças com necessidades especiais, além dessas defasagens, elas necessitam de acompanhamento com equipe multidisciplinar, o que muitas vezes não ocorre”.


Esses fatores interferem no desenvolvimento da criança e do adolescente, o que pode afetar a inclusão escolar. Dependendo da deficiência intelectual do menor de idade ou, quando autista, do grau de suporte dele, a ausência de uma equipe multidisciplinar provoca atrasos no desenvolvimento motor ou no desenvolvimento da fala, além de afetar outras áreas.


Haidee Lopes, professora na E. E. Prof. Crispim de Oliveira, localizada na zona norte de São Paulo, destacou também que a vulnerabilidade socioeconômica sujeita os pais e os alunos a situações degradantes, pela dependência do sistema público de educação. “Muitas instituições públicas não cumprem com seu papel de receber esses alunos de maneira adequada e com recursos básicos da educação inclusiva.”


Socialização afetada


Crianças e adolescentes autistas e deficientes interagem em evento, o que é raro nas escolas. [Foto: Kimberly Dias]

Jéssica Oliveira, mãe de duas crianças autistas, Lívia (3) e Anthony (8), reclama que ambos os filhos não interagem muito com outras pessoas nas escolas em que estudam. Lívia frequenta a escola de educação infantil da ONG SOS Brasil Melhor na região de Carapicuíba. Anthony estuda na E. E. Prof. Ricardo Antônio Pecchio, localizada também em Carapicuíba, e está na terceira série. E é com o mais velho que a preocupação é maior.


“Ele só tem um amiguinho na escola. Ele não interage com outras crianças. Os professores não tentam [incentivar a interação].” Jéssica também relatou que Anthony sofre violência física de colegas e que a situação não é resolvida pela direção da escola.


O problema também é partilhado por outras famílias que dependem da escola pública para educar seus filhos. Adriana, mãe do autista Guilherme (8), concorda que a socialização é prejudicada.


"Ele não se comunica com os professores e com os colegas". Ela explica que a inclusão não ocorre porque o filho não possui professor de apoio e a docente da sala de aula não trabalha com a inclusão de Guilherme.

Despreparo dos professores


A falta de preparo dos docentes da sala de aula não é um fator que prejudica apenas Adriana. Lidiana, mãe do autista Gabriel (8), contou que no final do ano passado a professora machucou o garoto. De acordo com o que Gabriel mostrou à mãe, a professora puxou os cabelos dele e torceu os dedos dele para trás. Lidiana teve que ir à Secretaria da Educação relatar o caso. A professora saiu da escola, mas até esse momento ocorrer, Gabriel não foi mais assistir às aulas. Lidiana fez um acordo com a direção para que as tarefas fossem mandadas à sua casa.


Essas são apenas poucas das várias vozes que se somam denunciando docentes da rede pública. Muitos não sabem lidar com crianças e adolescentes da educação especial. Mas o problema nem sempre é o professor.


Jussara Cardoso, professora na E. E. Bolívar de Freitas, em Belo Horizonte, e que já trabalhou 26 anos na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), disse que o governo não investe na educação.


“Eu falo que nós não somos totalmente preparados nos cursos [de graduação] que a gente faz. A gente não sai de lá pronto e acabado. A gente tem uma noção do que é a deficiência ou aquela especificidade daquele aluno (...) e às vezes o professor se forma e fala ‘eu quero trabalhar com educação especial’ e vai com a cara e a coragem. É muito complicado, porque é uma responsabilidade muito grande”.


As grades curriculares das faculdades não possuíam matérias voltadas à educação inclusiva. A situação tem mudado ao longo do tempo. A Universidade de São Paulo (USP) é um exemplo disso. No curso de pedagogia, foi incluída uma disciplina chamada "Educação Especial - Fundamentos, Práticas e Políticas Escolares" em 2015.


Prejuízos no aprendizado


Um dos fatores que mais causa preocupação nos pais é o aprendizado. Lidiana contou que não percebe evolução no aprendizado do filho. "Ele não participa da educação física. E o caderno dele está do mesmo jeito. Só tem uma folha [usada], que foi do primeiro dia de aula. O resto não tem lição. E eu já conversei com a diretora para ela mandar lição para ele, e ela não manda.”


Essa percepção também é compartilhada por Jéssica. “Ele (Anthony) não sabe de nada: não sabe ler, não sabe escrever. Está na terceira série e não sabe nem qual é a letra A. É muito difícil a educação aqui.”


Com a pandemia do coronavírus, a situação piorou. Durante o período de 2020 e 2021, muitas crianças e adolescentes não tiveram aulas. O retorno presencial foi difícil para todos, principalmente para aqueles da educação especial. Foi o que Maggiolli Mathias, mãe do autista Davi (6), sentiu. O garoto é autista e estuda na EMEF Maria Aparecida Rodrigues Cintra, na zona norte de São Paulo.


"Devido a pandemia, ele ficou afastado da escola. O retorno presencial foi nesse ano e a gente teve vários problemas." Entre esses problemas, o principal citado por Maggiolli está a desregulação de Davi. Depois de três semanas fazendo a adaptação na escola, com o aumento gradativo dos horários, o menino começou a apresentar alterações no comportamento, como agitação e agressividade. Com a situação, Maggiolli teve que parar de mandar Davi para a escola.


"A inclusão na teoria é muito bonita, tem tudo lá por escrito, mas na prática a gente sofre bastante", conclui.

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