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Muros entre universidade e periferia

Atualizado: 24 de nov. de 2022

Mesmo com maior número de estudantes da periferia no ensino superior, a universidade pública ainda cria barreiras físicas e sociais

Por Cecília Freitas, Luana Takahashi e Mariana Rossi


[Imagem: Cecília Bastos/USP Imagens]


O aumento do acesso de estudantes da periferia às universidades públicas por meio da política de cotas, que completa 10 anos e será revisada em 2022, ainda não parece ser suficiente para reduzir as distâncias entre os periféricos e o ensino superior. ‘’Quando fui fazer faculdade, eu era um estranho na USP e ela era estranha na minha quebrada’’, conta Marcos Agostinho, sociólogo, cientista político e periférico.


Para Saulo Vilanova, morador do Jardim Ângela e estudante de Letras na Universidade de São Paulo (USP), “ainda hoje a gente é exceção. Eu conto nos dedos pessoas [do meu bairro] que conseguiram acessar uma universidade pública”. Saulo é o primeiro de sua família a fazer uma graduação. Seu primeiro contato com a universidade foi por intermédio de sua mãe, empregada doméstica, que trabalha na casa de um professor da USP. ‘’Desde cedo, a gente tem uma ideia de que a USP não é pra gente, é para quem a gente tá trabalhando’’.

Tiaraju Pablo D’Andrea, professor universitário, coordenador do Centro de Estudos Periféricos e oriundo da periferia urbana, explica, em entrevista ao Central Periférica, que esse afastamento é social e também físico. Segundo o professor, além dos jovens da periferia enfrentarem maiores dificuldades socioeconômicas em seus estudos, os campus universitários são muitos distantes das comunidades, sendo uma limitação também geográfica. A zona leste paulista tem 4,6 milhões de habitantes e duas universidades públicas, ‘’o ideal seria ter uma quantidade de universidades e de vagas tão grande quanto a quantidade de pessoas que querem entrar nas universidades’’, finaliza Tiaraju.

Os desafios vão para além do acesso. Uma vez dentro da graduação, começam os estranhamentos entre as vivências e diferentes realidades. “Dentro da USP eu sou favelado, mas dentro da quebrada sou playboy, quando se trata de estudo”, conta Saulo. Quem concorda com o depoimento do estudante é Marcos Agostinho, que lembra que, enquanto estava fazendo mestrado com bolsas estudantis de pesquisa, convivia com pessoas em sua comunidade que não tinham terminado o ensino fundamental e se surpreendiam com o fato dele receber para estudar.


O confronto entre as diferenças pode também ser uma possibilidade de fortalecimento da identidade e das origens. De acordo com Tiaraju, “quando você se depara com um ambiente que tem pessoas que são muito diferentes de você ou da tua trajetória, a tendência é você se reconhecer’’.


Pensando em aproximar a universidade da periferia e promover debates sobre o território dentro do ambiente estudantil, Saulo, junto com Lucas Leonel, também estudante de letras, criou o podcast “Memórias Quebradas”. A produção conta as histórias de bairros periféricos de São Paulo, lutas populares e a importância da memória. A segunda temporada do programa está prevista ainda para este ano. ‘’Se vem pessoas de outras realidades para cá, a gente também consegue colocar esse debate aqui dentro’’, diz Saulo, reafirmando a importância da periferia ocupar esses espaços.



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