A "Suíça brasileira" abriga mansões, hotéis e restaurantes, mas é também lar de diversos jordanenses periféricos
Por Alessandra Ueno
Vista do bairro Vila Santo Antônio. [Imagem: Arquivo pessoal/ José Eduardo]
Campos do Jordão é uma cidade conhecida como a “Suíça brasileira”, isso porque está em uma região alta, com um clima mais ameno que remonta bem o clima suiço, além de ter alguns bairros construídos no estilo europeu que fazem jus ao nome.
Mas quando abrimos a guia do navegador e pesquisamos “Morro em Campos do Jordão", o destaque é o Morro do Elefante, um local turístico. Quando digitamos “Vila em Campos do Jordão", achamos a Vila Inglesa, um bairro feito aos moldes europeus. Os que não aparecem são o Morro do Britador e a Vila Santo Antônio. Os dois bairros são comunidades periféricas de Campos, mas de periferia têm pouco. Ficam logo ao lado da entrada da cidade, bem na frente de todos que a visitam. O problema é que, mesmo vendo, muitos não enxergam.
Morro do Britador após deslizamento mais grave ocorrido em 2000. [Imagem: Reprodução/ IPT (2002)]
Beatriz, guia da empresa local Mais Turismo, comenta sobre os roteiros que eles fazem: “Nós não trabalhamos com a parte da entrada, temos roteiros de mansões, chocolaterias, cachaçarias, mas passamos pela rua principal que dá para ver essa região [Britador e Vila Santo Antônio]. Eu falo que lá teve deslizamento,morreram pessoas, que é a periferia. Que eu saiba, a prefeitura nunca fez nada quanto a isso, mas eu não conheço muito, não faz parte da minha realidade”. A fala de Beatriz retrata o que a maioria das pessoas pensa quando se fala de Campos do Jordão: uma cidade turística, com chocolate quente no inverno e mansões gigantescas de celebridades.
Mas, a cidade não é só isso. "A cidade gira em torno do jordanense, o comércio, as construções. Às vezes falam ‘Eu moro lá no Alto do Capivari (bairro luxuoso)’, mas na verdade eles estão trabalhando como caseiros, não é como se eles tivessem comprado aquela casa. Eles são até as pessoas que podem ter construído, mas não moram lá definitivamente”, disse o pastor José Eduardo, jordanense de nascimento.
Casas na Vila Santo Antônio. [Reprodução/ André Lucas, UOL]
O pastor viu a cidade crescer com o turismo e presenciou a disparidade entre o tratamento do bairro onde sua avó e tios moravam, a Vila Santo Antônio, e o centro da cidade. “O centro cresceu muito mais rápido. Campos é uma cidade turística, né? Mas demorou muito para o bairro ter os mesmos privilégios que o centro, como água, luz, esgoto”. José Eduard diz que são privilégios, mas na verdade são direitos do cidadão. O asfaltamento das ruas, a iluminação, o saneamento básico hoje presentes em boa parte da Vila Santo Antônio foram fruto de muita persistência: “Teve muita luta, muita reivindicação. Chamaram presidente da Câmara, fizeram ofício, falaram para o prefeito ‘vem aqui ver’ “.
Os postais da cidade sempre pegam a parte “bonita” da cidade, cortando o Morro do Britador e a Vila Santo Antônio. A cidade é turística, mas existem pessoas que a habitam. Mas, nem tudo é acessível a elas: “Jordanense vive como turista: turista paga mil reais, o jordanense também paga. Mesmo tendo sido ele quem fez o produto”, comenta José Eduardo.
Cortados de fotos e fora da realidade de alguns, esses bairros estão presentes e contam muito mais que desastres de deslizamento e falta de infraestrutura. As pessoas que moram na periferia tão próxima de Campos do Jordão são os cidadãos da cidade, mesmo o turismo sendo o principal destaque do local, e precisam ter a importância para o funcionamento da cidade ressaltada.
“Quando você vier aqui precisa conhecer a Vila Santo Antônio, o Morro do Britador. Aí, quando perguntarem ‘Ah, mas você já foi em Campos do Jordão? Lá é bonito’, você fala ‘Já fui sim, mas você conhece onde os jordanenses vivem? Lá também faz parte da cidade’ “
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