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  • Carolina Borin Garcia, Larissa Leal e Reginaldo Ramos

29 de maio de 2021 - O início de uma jornada popular


Colagem por Carolina Borin Garcia. Imagem: [Fotos de Reginaldo Ramos / Pixabay]

Protestos contra governo Bolsonaro marcam o fim do mês de maio e dão início a uma série de movimentações que prometem continuar pelo menos até o final de julho.


O dia 29 de maio marcou o início de importantes movimentos para a manutenção da democracia brasileira. De acordo com organizadores das mobilizações, cerca de 420 mil pessoas estavam presentes durante os protestos. Ao total, foram realizados em torno de 650 atos dentro e fora do território nacional. As manifestações aconteceram em todas as capitais do país, além de algumas cidades do exterior, como Londres, Berlim e Porto. Posteriormente, houve ainda mais dois dias de protestos em 19 de junho e 3 de julho, que fazem parte de uma extensa agenda de atos dos movimentos e partidos envolvidos.


As exigências do povo

Manifestações de 29 de maio de 2021 em Recife. [Imagem: Reginaldo Ramos]

Em meio à pandemia, com marco de 450 mil vidas perdidas, manifestantes de todo o Brasil se reuniram no dia 29 de maio para protestar contra a gestão do presidente Jair Bolsonaro. Os protestantes organizaram o movimento por meio de redes sociais e utilizaram a #29mforabolsonaro no Twitter e Instagram. As principais pautas da manifestação, além do posicionamento contra o governo vigente, foram a continuação do fornecimento do auxílio emergencial, maior eficiência da vacinação e medidas de combate contra o coronavírus.


Onde estão as manchetes?


Capa e manchetes dos principais veículos da grande mídia de São Paulo.

[Imagem: Reprodução Estado de São Paulo/ O Globo / Folha de São Paulo]


Ainda que os protestos tenham sido relevantes para o cenário político do país, a mídia hegemônica optou pelo silêncio. Um “silêncio ensurdecedor” nas palavras de Maria Luiza Nogueira, coordenadora do Centro Acadêmico Lupe Cotrim (CALC) da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.


Apesar de ter reunido centenas de milhares de pessoas ao redor do Brasil em meio a uma pandemia, os atos não tiveram o seu devido destaque na grande mídia. O grito de “basta” de uma população, que tem sofrido pela fome, por uma política ineficaz de combate à pandemia, por um auxílio emergencial irrisório, pelo agravamento das desigualdades e por um constante aumento do número de casos e mortes por COVID-19, foi calado.


A mídia hegemônica, com raras exceções, destinou as capas da edição do jornal de domingo, dia 30, a pautas relacionadas à economia e cultura, sem mencionar ou abordando de modo distorcido as mobilizações do dia anterior. Em detrimento do interesse público, vieses e interesses políticos e econômicos predominaram. Por outro lado, na imprensa internacional, em veículos como The Guardian, The Economist, El País, Le Monde, La Nación, os protestos tiveram maior destaque.


Novos capítulos

Com os protestos de 19 de junho, o cenário mudou. No dia em que o país atingiu a marca de 500 mil mortes, os manifestantes foram novamente às ruas, sob o lema de que “o presidente é mais perigoso que o vírus”. Em busca de transformar a dor da perda de meio milhão de brasileiros, que tiveram o seu direito à vida negligenciado, em força para a luta, os protestos ocorreram e conseguiram reunir um número significativo de participantes.


Diante da pressão, sobretudo, da população e de veículos independentes, a grande imprensa garantiu um maior destaque nas capas e pautas dos principais jornais da cidade de São Paulo e também do Brasil. Na concepção de Maria Luiza, um ponto fundamental para criar essa pressão e, também, para garantir a repercussão desses protestos independentemente da cobertura feita pela mídia tradicional, foram as redes sociais. “Foram aliadas número um”, diz a coordenadora do CALC.


Recentemente, novas mobilizações foram convocadas e aconteceram no dia 3 de Julho no país e no mundo. Inicialmente, os protestos estavam previstos para o dia 24 deste mês, no entanto, diante dos últimos acontecimentos da Comissão parlamentar de inquérito (CPI) da Covid, que revelaram o esquema de corrupção nos contratos da vacina indiana Covaxin, parte significativa dos movimentos sociais e da população compreenderam que voltar às ruas era urgente. Reivindicações como o impeachment do atual presidente, Jair Bolsonaro, ganharam ainda mais força.


Segundo dados da pesquisa da Confederação Nacional do Transporte divulgada no dia 5 de julho, a desaprovação do governo atingiu a marca recorde de 48,2%. Com essa insatisfação crescente e o avanço das investigações da CPI em meio ao agravamento da pandemia, as próximas semanas prometem novos capítulos a essa jornada popular da história brasileira recente. Movimentos sociais e políticos, além de parcela dos partidos de oposição, estão convocando novos atos para os dias 13 e 24 de julho.



E para que servem os atos?

Diante desse cenário de insegurança na saúde pública estabelecido no país, é natural que a população se pergunte: vale a pena ir às ruas nesse momento? A raiz dessa dúvida muitas vezes se encontra em um ceticismo comum a muitos brasileiros com relação ao potencial de impacto das manifestações. Quando questionada sobre os atos, Julia Vasconcelos, estudante da UFRPE, disse: "Não acredito que essas manifestações mudem alguma coisa no nosso cenário político, acho que precisamos de movimentos mais enérgicos.” Para melhor avaliar essa incógnita, conversamos com o cientista político Alexsandro Ribeiro.


Mestre pela Universidade Federal de Pernambuco, Alexsandro entende que as manifestações são uma importante ferramenta para pressionar o Governo Federal, ajudando na construção de uma conjuntura política favorável às pautas dos manifestantes e às projetando no campo do possível. No entanto, segundo Alex, apesar da eficácia dos atos com relação a pautas como o retorno do auxílio emergencial e ao recuo nas políticas de austeridade fiscal, a abertura de um processo de impeachment, que é a principal demanda dos manifestantes, parece uma realidade ainda muito distante. O cientista afirma que os setores opositores ao governo Bolsonaro não têm adesão suficiente na câmara para dar continuidade ao processo, e que por isso, não seria prudente por parte da oposição iniciá-lo, visto que uma eventual não concretização do impeachment fortaleceria o governo atual.


Manifestações de 29 de maio de 2021 em Recife. [Imagem: Reginaldo Ramos]


Com a conturbação política do país, é difícil prever o que pode acontecer nos meses que se seguem. Apesar disso, é notável que as movimentações populares nas ruas têm uma ampla influência na dinâmica democrática nacional, e tem potencial para alcançar muitos de seus objetivos. A participação popular na política via manifestações nas ruas, greves e afins, é uma tônica latente na América Latina desde muito antes do nascimento de suas repúblicas. Foi por meio dessas ferramentas que o povo conquistou seus direitos desde então. Os atos brasileiros do presente momento constituem mais uma dessas expressões populares na busca por seus direitos básicos. Resguardando suas particularidades, trata-se de mais um evento dentro de uma longa construção na história latino americana.


“La historia es nuestra y la hacen los pueblos” - Salvador Allende

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