Entre as reclamações estão problemas com funcionários da saúde, com outros pacientes e assédio.
Pessoas transexuais encontram complicações no acesso à saúde na cidade de São Paulo. Apesar de a legislação garantir e regulamentar o atendimento a essa parcela da população, entrevistados encontram dificuldades em diversas etapas do atendimento. Iniciativas de universidades e hospitais especializados se mostram como alternativa útil, mas pouco abrangente.
A população transexual é historicamente discriminada no Brasil. Nas últimas décadas, progressos relevantes foram alcançados na asseguração da cidadania plena à população transexual e travesti. Documentos como o Protocolo para o atendimento de pessoas transexuais e travestis no município de São Paulo, de Julho de 2020, e o Decreto Nº 58.228, de 16 de maio de 2018, que dispõe sobre o respeito ao Nome Social em locais vinculados ao governo municipal, buscam colaborar para isso. No entanto, pessoas transexuais continuam sendo desrespeitadas quando buscam atendimentos médicos.
O desrespeito real
Mica Caeto (20) é estudante de História na USP, pesquisadora e travesti. Contando sobre seu processo de transição, chama atenção para um ponto: a transição vai além da hormonização, também é um processo de autorreconhecimento. “Eu sabia quem eu era antes de saber o que eu era”, ela diz. A estudante conta que faz hormonização em um centro especializado, no Hospital Santa Cecília, referência na hormonioterapia. Por ser um local especializado, ela conta que recebe um atendimento muito melhor. Mas mesmo lá Mica teve entraves. Apesar da boa experiência com a equipe médica, conta que teve problemas com outros pacientes, principalmente os mais velhos, sendo indiscretos com comentários e olhares.
Neith (23), estudante de Terapia Ocupacional na USP, artista e Drag Queen, comenta sobre as dificuldades que teve buscando atendimento no SUS como homem trans. Buscando fazer seu cartão do SUS, a pessoa responsável o confundiu com uma mulher trans e não quis utilizar seu nome social. Foi necessária a intervenção de outra funcionária. Após resolvida a situação, a funcionária disse “desculpa pela confusão, moça”. Neith conta que o erro no tratamento é uma situação comum, já que na ficha médica ficam escritos os dois nomes, o social e o de registro.
Em outra situação, buscando fazer mastectomia por um médico particular, foi assediado ao ter que ouvir que era uma pena querer tirar “mamas tão bonitas”.
Talisha Ribeiro (23) é estudante de Artes Cênicas na USP. Atualmente mora em Volta Redonda, no Rio de Janeiro, por causa da pandemia, mas tem planos de voltar para São Paulo em breve se a vacinação ocorrer conforme o esperado. Se reconheceu como travesti em 2020. Tamisha avaliava se optaria ou não pela hormonização quando começou a pandemia. Buscou consultas pelo setor privado para conversar sobre o assunto. Encontrou complicações buscando assistência médica em Volta Redonda e chegou a cogitar a fazer a hormonização pelo ambulatório da Unifesp, mas não poderia ser encaminhada de Volta Redonda.
Talisha conta sobre uma experiência que teve buscando atendimento pelo SUS. Durante o atendimento, se sentiu pressionada a escolher um nome social na hora e a tomar decisões quanto ao uso de hormônios. Na consulta, a médica a confundiu com um homem trans, confusão percebida quando perguntou a Talisha a quanto tempo ela não menstruava. A estudante considera que foi um problema de preparo.
No final, Talisha buscou atendimento pela Faculdade IPEMED de Ciências Médicas de Copacabana.
É comum a busca de atendimentos especializados, como os oferecidos por faculdades, como alternativa ao SUS. Essa solução, no entanto, não consegue abranger todas as pessoas transexuais e travestis, além de não substituir a obrigação do Estado de fornecer saúde.
Complementando o assunto, veja o que a covereadora Carolina Iara tem a dizer sobre o tema.
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