Na contramão das pesquisas historicamente realizadas no Jardim São Remo, o Censo Vizinhanças USP oferece dados importantes para que a comunidade lide com seus problemas e explore suas potências
Gabriel Silveira e João Pedro Abdo
Visão Panorâmica Jardim São Remo (Fonte: Facebook)
A USP realizou entre janeiro de 2019 e abril de 2021 um censo com as comunidades vizinhas dos campi da universidade na cidade de S. Paulo. Este projeto foi coordenado pela cátedra Olavo Setubal de Arte, Ciência e Cultura do Instituto de Estudos Avançados (IEA). Publicado em agosto de 2022, o estudo levantou dados demográficos e traçou o perfil dos moradores de quatro comunidades: Jardim São Remo e Sem Terra, situadas no entorno da Cidade Universitária, e Jardim Keralux e Vila Guaraciaba, localizadas próximas à USP Leste.
A relação entre os campi e as comunidades é antiga. No caso do Jardim São Remo, por exemplo, sua história se mistura com a da própria Cidade Universitária. A origem remonta às décadas de 1960 e 1970, quando os trabalhadores que participaram da construção das faculdades e institutos do campus do Butantã ocuparam áreas no entorno. Entretanto, conforme explica Danilo Pereira Sato, supervisor de campo do censo e doutorando em Geografia Humana pela EACH-USP, as pesquisas realizadas pela USP na São Remo ocorriam geralmente de maneira verticalizada. Por exemplo, uma coluna do jornalista Matthew Shirts publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo em 12 de novembro de 1997 de nome “O campus é do povo (3)” cita o depoimento de uma moradora que dizia se sentir uma “cobaia de laboratório” da Universidade.
"Então, eles vêm, pegam o que precisam e não dão retorno algum para a comunidade. Às vezes acontece de alguma faculdade ou outra fazer algum projeto e dar algum retorno", conta Reginaldo Santos, educador e presidente do Projeto Alavanca Brasil. Citando como exceção o jornal Notícias do Jardim São Remo, editado pela ECA-USP, e alguns projetos da FAU-USP, Reginaldo lembra que são poucas as iniciativas universitárias que realmente dão alguma devolutiva às comunidades.
Além disso, houve um receio entre os moradores mais antigos quanto à reintegração de posse do terreno onde vivem, que um dia pertenceu à Cidade Universitária. “Quando se falava que a USP iria fazer uma coleta de dados, [os moradores] já associavam com as piores coisas da face da terra, como ‘vão arrancar minha casa’, ‘porque eles querem esses dados?’, ‘o que eles vão fazer com isso?’”, diz Ericsson Magnavita, morador que, durante a pesquisa do censo, desempenhou o papel de articulador entre a comunidade e os pesquisadores.
O censo trouxe algumas mudanças que tentaram minimizar os problemas da integração entre a USP e a sua vizinhança, conforme explica Danilo Sato. Para que a cobertura total dos domicílios fosse atingida, por exemplo, a figura dos articuladores foi indispensável. “Nós tínhamos um ‘corpo a corpo’ a mais com a população, a gente entendia e conseguia ter uma sensibilidade maior do que o estudante que está aqui dentro só para desenvolver um projeto. Nós conseguimos passar para os dois lados a importância de cada um”, conta Ericsson.
Da distribuição de cestas básicas na pandemia à captação de recursos para projetos, os dados auxiliarão a comunidade. “O censo foi um retorno visível, então têm os livros que estão à disposição para a comunidade consultar. Além do site que têm as mesmas informações, que qualquer um pode ter acesso”, explica Reginaldo.
Maiores informações podem ser encontradas aqui
Estatísticas da população concedidas pelo censo
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