Convivência familiar: o que mudou com a pandemia do coronavírus?
Relações familiares intensificadas durante o isolamento social nas periferias
Por Beatriz Hermínio e Luisa Costa
Para frear a disseminação e prevenir o contágio pelo Covid-19, incentivamos o distanciamento social, suspendendo a grande maioria das atividades presenciais. Entramos em uma rotina para a qual ninguém estava preparado, o que trouxe uma série de dificuldades, afetando, inclusive, nossas relações familiares e nosso psicológico.
Isabel Cristina Gomes, professora do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, destacou à Central Periférica que as mudanças produzidas pela pandemia na convivência e nas relações familiares dependeram do tipo de dinâmica relacional que cada família apresentava anteriormente.
Lucas Abreu, morador do Jaçanã e integrante da Rede de Apoio Humanitário nas e das Periferias, conta que a convivência em casa foi bastante intensificada; por isso, aconteceram alguns conflitos e momentos de estresse e ansiedade. Esse foi um quadro comum, no geral, principalmente quando se estava em um momento mais rígido da quarentena.
Já nas famílias que possuíam uma forma patológica de relacionamento, Isabel destaca como a convivência intensificada acirrou as tensões e aumentou as condutas violentas, principalmente contra mulheres, crianças e outras minorias. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, houve um aumento de quase 2% nos casos de feminicídio em comparação com 2019; além disso, destaca-se a subnotificação da violência doméstica.
Desigualdade exposta
Pode-se pensar que nas periferias a convivência sob o mesmo teto pode ter se acirrado também porque, geralmente, há muitas pessoas vivendo em um espaço relativamente pequeno. Por outro lado, foi principalmente nessas regiões que o isolamento social apresentou taxas menores, com menos pessoas fazendo home office, por exemplo.
Essa situação trouxe consequências emocionais. Como afirmou Isabel, a pandemia pode ter afetado também quem não pôde fazer o isolamento, “na medida em que o medo da doença, da morte e a culpa de contaminar familiares, trouxe angústias e incertezas, fazendo com que a própria rotina do dia a dia ficasse mais carregada”.
Esse é um dos aspectos que mostra como a desigualdade social foi escancarada com a pandemia, seja pela (im)possibilidade de se trabalhar e estudar à distância, pelo acesso aos tratamentos de saúde ou pelas altas taxas de mortalidade pelo Covid-19 nas periferias.
Aproximação benéfica
A intensa convivência familiar, entretanto, não teve apenas resultados negativos. Como explica Isabel, as relações sofreram interferência no sentido de gerar sentimentos conflitantes e desagregadores ou alimentar afetivamente o grupo, a depender de cada situação.
Maria Aparecida dos Santos, moradora da Cidade Tiradentes, conta que as mudanças na rotina foram muito difíceis e que os encontros familiares deixam saudade, mas “como o amor e o carinho que a gente [a família] tem um pelo outro é grande, a gente tá sabendo lidar com isso”, e conta que tentam suprir o contato pela comunicação online.
Isabel diz que é difícil pensar em regras para uma boa convivência familiar, pois cada indivíduo e família são únicos, mas é importante praticar uma boa comunicação (desenvolvendo a capacidade de escuta) e investir em relações igualitárias, na solidariedade e nas trocas entre cada elemento que compõe o grupo.
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